Depois de dois dias em Burgos retornei a caminhar. No primeiro dia de caminhada fiz 20 km até o povoado de Hornillos del Camino. Não encontrei meus amigos, que pararam duas paradas a frente.
No dia seguinte a minha distância dos amigos, aumentaria. Seria novamente 20 km. Começado o dia, percorri facilmente em 4 horas os 20 km até Castrojeriz. Meus pés estavam bem e não apresentavam inchaço ou dores. Fiz um lanche e tomei a decisão de continuar a caminhar até a cidade seguinte.
Chegando em Itero del Castilho ao meio-dia, quis avançar até o próximo povoado. Itero de la Veiga, era uma cidade muito erma o que me lembrou Hornillos. Decidi caminhar mais 6 km até Boadilha onde muitos amigos do caminho iriam pernoitar. Eram mais seis quilômetros.
Encontrei Steve de Boston e o convenci a ir comigo até Boadilha. Por volta das 14 horas e 39 km depois, cheguei a Boadilha del Camino. Os amigos se impressionaram com nossa chegada, principalmente com a minha que estava com o pé lesionado a dois dias atrás. Eu me sentia bem e meus pés estavam sem dores.
O albergue era muito simpático, com um largo jardim que reunia duas edificações, uma para os quartos e outra para o restaurante. O hospitaleiro nos colocou nas camas no mezanino, que não eram beliches. Pediu para nos ajeitarmos e depois passássemos em seu escritório, para carimbarmos a credencial e acertar a hospedagem.
Banho tomado, roupa lavada, fui ao escritório. No retorno, na porta de entrada do albergue, que dá para o jardim, encontro uma mulher de meia-idade, que me faz um sinal com a mão. Imaginei que estivesse perdida e precisasse de ajuda. Quando chego mais perto, noto a Canon em seu pescoço. Ela pergunta se poderia tirar uma foto minha de frente para o jardim. Achei estranho o pedido, mas pensei “Por que, não?” e aceitei.
Ela tirou a foto e enquanto me agradecia, vi uma horda de pessoas com suas câmeras no pescoço. Então, entendi tudo. Eram os turistas CVC, que eu encontrava de vez em quando pelo caminho. Eles compram um pacote Caminho de Santiago e vão parando nos pontos principais para fotografar e comprar souvenir.
Assim como o índio da Amazônia, o pigmeu da Austrália e as senhoras bolivianas com suas roupas típicas , o peregrino na Espanha é uma atração turística. Afinal, o que faz uma pessoa andar 820 km a pé e dormir em quartos compartilhados com cento e cinquenta pessoas, enquanto é possível faze-lo de ônibus climatizado e dormindo em belos paradores em apenas sete dias?
Não dei o prazer de ser a atração turística para aquela horda, já bastava ter sido daquela mulher. Me retirei para o quarto, para tirar meu cochilo da tarde.
foto: Vista de Castrojeriz a partir do Alto Mostelares (acervo pessoal)