Quando se morre em Santiago

Santiago

Ao terminar de beber minha Coca-Cola, me despedi da turma que ficava em O Pedrouzo e retornei para o caminho. Era por volta do meio-dia e faltavam apenas 20 km para chegar em Santiago.

Nesse trecho o sol estava fraco e o caminho, vazio. Era a nossa despedida. Um misto de emoções invadiam o meu ser. A alegria da chegada e a tristeza da partida. Nesses últimos quilômetros eu ri e chorei. Tinha a certeza que a chegada a Santiago não era o fim e sim o começo.

Às duas da tarde encontrei Paulo sentado num bar em Labacolla. Parei para almoçar com ele. Continuamos a caminhada, juntos. Passamos pelo Monte del Gozo, de onde avistamos a Catedral, cinco quilômetros dali.

Entramos no centro de Santiago por volta das cinco da tarde. O fim da jornada se aproximava. Na Ruá* de San Pedro avistamos as torres da Catedral. Uma súbita energia preencheu a todos os peregrinos fadigados, que começaram a correr, como quem vai perder o trem. A rua termina na entrada do centro histórico de Santiago. Ali, não havia mais setas a seguir. Deixei então, o coração me guiar. Subi as ruas de pedra e ao cruzar a Praza* Cervantes, no topo da subida, avistei lá embaixo a Catedral.

Continuei a descida. As gaitas de fole galegas, marcavam a chegada. A emoção tomou conta de mim e as lagrimas caiam. Finalmente havia chegado a Catedral de Santiago de Compostela. Adentrei pela Porta Santa e me coloquei na fila para abraçar Santiago, uma tradição da Catedral. Eu não acreditava que tinha conseguido.

Ao sair da Catedral, parei na Praza do Obradoiro, para contemplar a beleza da sua celebre fachada. Entre turistas e peregrinos do mundo todo, reencontrei alguns amigos que chegaram antes na cidade.

Marcamos de jantar mais tarde, pois, eu precisava de um banho e de roupas limpas. Cheguei no albergue e pela primeira vez em dias quebrei a rotina. Nada de lavar roupas, curar as feridas e traçar a rota do dia seguinte.

No jantar o espanhol Roberto, veterano da caminhada, nos contou que o caminho possui uma representação simbólica da vida. Quando começamos no caminho, seja aonde for, é o símbolo do nascimento ou do parto. A chegada a Catedral é o momento da morte, é quando finda a caminhada. Porém, podemos renascer em Finisterra, cidade marítima, que está há três dias de caminhada de Santiago. O mesmo tempo entre a morte e ressurreição de Cristo.

Naquele dia, pela primeira vez naquela viagem eu vi o pôr do sol. Um por do sol a meia-noite. A cidade estava em festa. Eu estava em festa. Até que a morte ser alegre. Talvez os mexicanos estejam certos.


* a grafia está em galego.

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No prato

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Florais – Arranjo de Camélias

super lua

Super Lua

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